29 de junho de 2011

Beau travail, de Claire Denis (França, 1999)

Beau Travail é um daqueles filmes que nos impõem o limite de lidar com a matéria audiovisual usando meras palavras. A verdade é que nada que eu escreve servirá nem pra quem viu o filme reconhecer aqui sua experiência, nem pra quem não viu o filme entender porque ele é algo tão forte que se carrega conosco - pela duração e depois. Mas, tentar essa inútil ponte segue sendo a sina do crítico (mesmo "ex"), e não fujamos dela portanto. Claro, antes de tudo, que ele é o filme que, junto com o seguinte Trouble Every Day (2001), potencializa e encontra no ápice do domínio/risco/encontro tudo que estava no cinema de Claire Denis desde os primeiros filmes (muito falados abaixo), e cuja força é tão grande que ameaçaria muito os próximos (e me parece notável como ela - e seus colaboradores - conseguiu fugir destes perigos, com humor, sensibilidade, inteligência e autoconsciência - algo parecido por exemplo, com o que se deu com o Tarantino pós PulpFiction/Jackie Brown). Mas algumas coisas se deve dizer: primeiro sobre a forma como o filme usa dois elementos para além (ou em complemento) ao seu já muito decantado "cinema do corpo" (elementos que estão em seus outros filmes, mas aqui se mostram decisivos demais) - a paisagem e o rosto. Entre o rosto de Denis Lavant e as paisagens desérticas aqui expostas, todo um universo existe. Um universo que nos remete pra trás no cinema (Apocalypse Now, certamente) e se expande pra depois (Gerry, por exemplo), mas que acima de tudo choca pela mistura de coerência total (portanto remete a muito pensamento, conceito, ideais) com um instinto de cinema e de vida incomum nos planos, cortes, encenações, música. É um filme que ao mesmo tempo que apresenta todo seu jogo já na primeira sequência, não para de nos fascinar e surpreender. O que mais se pode dizer sem só soar ridículo no elencar de superlativos? Apenas que não é fácil entender como um filme consegue ser tão abstrato a partir do que há de mais concreto no mundo (as presenças - dos corpos, dos atos, dos espaços) - ou vice-versa. O filme resta um mistério. Que bom.
(boa leitura: http://www.kinoeye.org/03/07/delrio07.php)
(entrevistas: http://www.bfi.org.uk/sightandsound/feature/30;
http://film.guardian.co.uk/interview/interviewpages/0,,338784,00.html)
(visto na sala 1 da Caixa Cultural-RJ, em 35mm, dentro da mostra Claire Denis: Um Olhar em Deslocamento)

2 comentários:

Eduardo Valente disse...

não por acaso eu não disse nada de fato sobre o filme (seus temas, narrativas, ressonâncias, implicações filosóficas e de sentido no entendimento do humano no mundo). porque aqui é só um parágrafo mesmo, um sentimento.

Eduardo Valente disse...

ah, mas uma coisa vale dizer: que ele venha ao mundo um ano depois, quase junto mesmo, de Além da Linha Vermelha, de Malick, é uma coincidência maravilhosa. os filmes não têm nada a ver, e são gêmeos.